A edição em DVD da comédia de António Lopes Ribeiro "A Vizinha do Lado" (baseada em uma comédia de André Brun) reserva uma agradável surpresa: a inclusão como extra do documentário "Lisboa de Hoje e de Amanhã" (1948), também de António Lopes Ribeiro.
Trata-se de um excelente filme que retrata a profunda transformação urbanística de Lisboa ocorrida nos anos anteriores e também em curso à época: avenidas novas, limpeza e arborização de Monsanto (meio milhão de árvores plantadas!) bairros sociais (Encarnação, Caselas, Campolide), etc.
Toda essa requalificação (como hoje se diz) urbanística obedecia a um plano metódico e faseado, de que se destaca:
- a concepção de cinco (!) circulares rodoviárias, uma delas subterrânea, que envolveria em parábola a baixa;
- a construção regra geral em baixa altura (os prédios de seis andares das avenidas novas são já considerados altos!);
- os bairros sociais, que constituíam um aglomerado de vivendas, cada uma com um quintal, permitindo a cada família ter o seu espaço próprio integrado num todo harmonioso (não podemos deixar de nos lembrar da aversão que Salazar tinha aos prédios de apartamentos, a que chamava "colmeias"). Transplantava-se, assim, um pouco do espírito de vida aldeã para a grande cidade;
- aumento do número de parques infantis e de equipamentos desportivos;
- demolição de casas degradadas em zonas insalubres e renovação de arruamentos (paradigmática a demolição do Arco do Conde de Alegrete, perto do Martim Moniz);
- arruamentos largos, alguns dos quais sem qualquer construção adjacente;
- para lá da circular mais exterior não haveria praticamente construção, evitando-se os grandes aglomerados suburbanos e consequente congestionamento da cidade.
Tratava-se de todo um plano integrado, coerente, ambicioso e com uma perspectiva de qualidade de vida (como então se não dizia) sinónimo de espaços livres, trânsito moderado, construção pouco volumétrica. Escusado falar da subversão de toda esta lógica urbana na nossa era de exploração urbanística e construção desenfreada.
De salientar, igualmente, outro "extra" precioso no DVD de "A Menina da Rádio", a comédia de Arthur Duarte: um documentário, também de António Lopes Ribeiro, sobre a inauguração do Estádio Nacional. O realizador, com notável gosto, cuidado nos enquadramentos, captação das coreografias do espectáculo, aproveita para nos trazer um momento extraordinário de exaltação nacionalista.
É realmente de louvar que se traga ao público estes documentos históricos enquadrados por comentários que de modo algum caem nas graças do regime que nos desgoverna. Para quando a edição em DVD de "A Revolução de Maio", do mesmo António Lopes Ribeiro?
1 comentário:
Por que não, também 'O Feitiço do Império'?
E outros!
O politicamente correcto impede que estas obras se tornem públicas.
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