sábado, setembro 01, 2007

In Memorian Henri Amouroux

Já faleceu no passado dia 5 de Agosto mas não podia deixar passar em claro a morte de Henri Amouroux. Jornalista antes de historiador, Amouroux vem a prestar um serviço inestimável a Clio com a sua monumental (10 volumes) "Grande Histoire des Français sous l'Occupation".
Recusando os lugares comuns sobre o regime de Vichy, Amouroux mostra as contradições do regime, expõe o seu jogo duplo, o equilíbrio instável entre resistir às instruções brutais do ocupante alemão e a impossibilidade de uma governação livre. Mostra também como a existência de um corpo de governo intermédio (Vichy) entre os alemães e o povo francês poupou a este último as agruras que uma Polónia ou uma Holanda sofreram. Laval e Pétain aparecem não como traidores mas como governantes que sacrificam a sua auto-estima tentando proteger na medida do possível os franceses. A título de exemplo, e algo que é frequentemente ocultado pela versão oficial da história, foi mínimo o número de judeus franceses que foram deportados; já os judeus estrangeiros a residir em França não tiveram essa sorte; foi a negociação permanente, pouco agradável mas, como neste exemplo, preferível a não haver qualquer mediação entre um ocupante impiedoso e a população, a marca de Vichy. Daí as críticas, também permanentes, de que foi alvo por parte dos (verdadeiros) colaboradores, políticos, jornalistas e intelectuais. O que não impediu alguns deles de virem a exercer cargos oficiais no regime; exemplo: Marcel Déat.
Amouroux vem a ter um relevo mediático devido à sua defesa de Maurice Papon, o prefeito da Gironda naquele período; Papon, que terá sido responsável pela deportação de algumas centenas de judeus, obedeceu a ordens; ainda há quem não queira perceber que essas ordens, pouco agradáveis, seriam bem mais impiedosas se vindas e executadas por alemães.
O mesmo se passava quando a resistência cometia um atentado; como retaliação, os alemães exigiam o fuzilamento de x prisioneiros; lá vinha Laval tentar diminuir o número dos sacrificados; num caso conseguiu passar de 100 (pedidos pelos alemães) para 5; logo a Rádio Londres veio clamar que o governo de Vichy tinha fuzilado 5 patriotas... Realmente era cómodo estar sentado ao microfone, na Albion, a zurzir quem arriscava a reputação e a vida para proteger os franceses de uma ocupação que foi consequência de uma clamorosa derrota militar de que a democratíssima III República foi única e exclusiva responsável.
O legado de Henri Amouroux foi o seu esforço em retratar tão conturbado período como ele foi e não como a ideologia vencedora o tem pintado, com as cores da mentira e do maniqueísmo.

1 comentário:

O Réprobo disse...

Não conheço o opus magnum, mas há um livro dele, da série «A Vida Quotidiana», sobre os franceses durante a Ocupação, que é leitura interessante e desmi(s)tificadora, também.
Ab.