segunda-feira, novembro 05, 2007

Por Espanha

Aproveitei o feriado e a "ponte" para passar quatro dias pelo sul de Espanha e descansar um pouco, em família, longe dos dramas pátrios e, uma das poucas desvantagens da ausência, do brilhantismo belenense, tanto no futebol (empate com o campeão) como no andebol (vitória sobre o campeão ABC); no meio de tantos confrontos com campeões em título, só o basket claudicou frente à super-Ovarense.
Por Espanha, os dramas de sempre: regionalismos / nacionalismos, choques (e insultos) entre PSOE e PP, 11-M (novilíngua para os atentados de 11 de Março de 2004), derrota(s) do Real Madrid...
Mas a primazia noticiosa foi para a "resolução" do 11-M, com a condenação a várias dezenas de milhar de anos de prisão (!) de três indivíduos, algumas condenações a outros por menos de 20 anos, a absolvição de um terrorista notório já condenado em Itália (fiquei a conhecer o princípio jurídico non bis in idem...) e... a não resposta a muitas das dúvidas de quem vem contestando a versão oficial (agora com cobertura jurídica) dos atentados: o incrível périplo da mochila de Vallecas, que impossibilitaria tratá-la como uma prova fidedigna - mas foi o oposto o que o juíz decidiu ; o suposto suicídio colectivo dos supostos autores dos atentados, em Leganés; entre outros. Aqui assumiu sempre um papel irreverente, na melhor tradição do jornalismo de investigação, o diário "El Mundo", ao passo que o conservador "ABC" teve, na edição do dia seguinte ao das sentenças, uma postura lamentável, criticando as "teorias da conspiração" e aceitando de bom grado a reforçada versão oficial, mesmo pejada como está de incongruências e questões não resolvidas (e outras elididas).
Com muito menos destaque, mas igualmente sinistra, a aprovação nas Cortes da Lei de Memória Histórica, que pretende remover de vez todos e quaisquer vestígios de franquismo das instituições, do ordenamento jurídico, da toponímia... A bem dos valores democrátricos e humanistas, está bem de ver. Muito a propósito, aquando da ovação da maioria após a aprovação da lei, alguns deputados viraram-se, embevecidos, para as galerias, onde estanciavam algumas figuras históricas que supostamente terão ficado satisfeitas com o resultado da votação; entre elas, Santiago Carrillo - esse mesmo, o carniceiro de Paracuellos. Como sempre, a esquerda tem uma "memória histórica" muito selectiva.
De resto, a Espanha que nos é trazida pelos periódicos assemelha-se a uma país doente, em confronto permanente (muito dele alimentado artificialmente pela classe política e pela imprensa e com menos eco na população do que se quer fazer crer); um país que já se começa a inquietar com o próximo fim do boom económico, quase todo ele baseado na "bolha" imobiliária; um país sempre à beira de um confronto - de palavras - com Marrocos (último motivo: a visita dos reis de Espanha a Ceuta e Melilla); um país onde se fala já abertamente de "imigração excessiva". Um país, também, em que o desporto (com destaque para o futebol e o basket) é cada vez mais um escape às agruras do quotidiano.
Um país que procura manter um certo nível de vida, que adora beber um copo e comer bem; em que os restaurantes, mesmo médios, procuram ter um certo requinte, ser acolhedores. Um país, por fim, onde se continua a não fazer um esforço mínimo para se perceber o que é que os estrangeiros dizem. Por lá, o no comprendo ainda continua a ser uma instituição.