Todos sabemos como o mundo do trabalho hoje em dia, e em especial no sector privado, tende a ser um "mundo cão": obrigações sem fim, inexistência de horários, ameaça permanente de "reestruturações" - um sem fim de factores que perigam a realização profissional e a saúde.
Até há poucos anos era habitual ouvir-se falar de pessoas na casa dos 50 anos que sofriam ataques cardíacos. Mas hoje multiplicam-se os relatos de trabalhadores com 30 anos, e às vezes até menos, a contas com problemas de saúde por excesso de trabalho e dificuldade psicológica de conviver com a incerteza permanente no que ao futuro do seu posto de trabalho diz respeito.
A exploração começa cedo: os felizardos que obtêm um estágio numa grande empresa sujeitam-se a jornadas de trabalho de dezasseis horas, sem receberem mais por isso - e têm que se sentir realizados pois abre-se-lhes uma porta de futuro profissional de que poucos se podem vangloriar.
Noutras empresas com carga de trabalho mais equilibrada o espectro do desemprego é permanente pois nunca se sabe quando é que surgirá vindo de algum cérebro iluminado um plano de redução de postos de trabalho.
Isto tudo se passa num mundo orientado para o consumo em larga escala: longe vão os tempos em que o "português obscurantista" apenas gastava 70% do seu rendimento e guardava os restantes 30% para o incerto futuro. Hoje, com taxas de juro baixas, com facilidades de crédito e um sem fim de incentivos ao consumo, a que se associa uma imagem de estilo de vida a que poucos resistem, há já indivíduos que gastam, em consumo corrente e prestações, praticamente tudo o que ganham. Em bom português, estouram tudo quanto lhes chega à conta bancária no fim do mês - e que se dane o futuro! Mas ao menos podem "desfilar" a casa e o carro perante os olhares dos amigos, elogiar os acabamentos do apartamento ou os estofos em pele do "espada".
Um dinamarquês meu amigo espantava-se com a redução do trânsito nas estradas de Lisboa e arredores na última semana de cada mês: pudera, a malta está tão endividada que nos últimos dias antes de receber o ordenado já não tem dinheiro para a gasolina!
Estas reflexões vieram-me à mente após saber que um colega meu, de 34 anos, sofreu uma trombose, felizmente sem consequências gravosas. Penso também num confrade e amigo blogosférico que trabalha sem parar, de resto disso se ressentindo a sua produção blogueira. Penso nas pessoas que conheço a contas com problemas estranhos de saúde e também em alguns que sucumbiram aos modernos tempos empresariais.
Trocando umas impressões com o Rafael Castela Santos, lamentava-se este amigo: "como estamos longe da doutrina social da Igreja!" Será que neste dia de Páscoa podemos crer na sua ressurreição?
5 comentários:
Em Novembro ouvi incrédulo de um médico a possibilidade de um enfarte caso eu não mudasse o meu modo de vida... eu, que tenho uns míseros 27 anos e que sempre julguei que essa seria uma preocupação só a partir dos 40 anos.
Esta vida moderna mata-nos antes do tempo...
Boa tarde e um abraço. Um post a reler.
Olha que andam aí outros com a nossa assintura...
Caro Amigo,
Há que ressuscitar Le Play e La Tour du Pin - e com urgência.
Um abraço.
Tenho pena por essas pessoas... mas que fazer a quem está disposto a empenhar-se nessas condições? Proibir, pelo próprio bem delas, e em nome de uma santa doutrina? Socialismo católico?
Con retraso, porque soy otro de los sometidos a veces a jornadas de 14 y 16 horas, doy la bienvenida a este articulo tuyo, querido FSantos.
Intentare poder escribir sobre ella mas adelante.
Un abrazo,
Rafael Castela Santos
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